Futebol Nacional
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PAIXÃO POR UM FIO

Tradição de atletas da Associação Atlética Santa Lúcia resulta em cena pitoresca no campo do time

Na Zona Sul de BH, chuteiras dependuradas são chamadas até de obra de arte

postado em 23/10/2016 11:00 / atualizado em 23/10/2016 12:10

Uma cena incomum, proporcionada pela paixão a um esporte: o futebol. Um fio elétrico, que passa sobre o campo da Associação Atlética Santa Lúcia, na Zona Sul de Belo Horizonte, chama a atenção. Lá estão dependurados nada menos que 60 pares de chuteiras, o que leva às seguintes perguntas: Por que estão ali?. Como foram parar lá? O fato é que o quadro ali visto em muito se assemelha a uma obra de arte. Por um capricho da natureza, passarinhos começaram a fazer ninhos em algumas delas.

O local não está à vista de qualquer pessoa. É preciso descer para o campo, longe da rua, bem próximo à lagoa – de água limpa, já que depois de anos está livre de poluição. Para os moradores da região, seja da Vila Paris, do São Bento ou do Aglomerado Santa Lúcia, é algo digno de admirar. Mas para os ex-donos das chuteiras, jogadores, arremessar a chuteira no fio significa uma tradição.

Leandro Couri/EM

Essa história teve início há alguns anos, segundo Paulo Roberto Faustino, de 52 anos, o “Robertão”, treinador das equipes de base do Santa Lúcia (infantil, infantojuvenil e juvenil). “O pessoal do time principal, os mais velhos, iam se aposentando e depois do último jogo jogavam as chuteiras no fio. Com o passar do tempo, os mais novos passaram a achar isso importante e antes mesmo de se aposentar passaram a repetir o gesto.”

Robertão está no “morro” há 40 anos. No futebol, há 35. Trabalha como porteiro à noite. Pela manhã e à tarde, treina as equipes. É rígido. “Quem não tiver nota boa na escola não joga. É suspenso até o próximo boletim.”

ALEGRIA E ORGULHO


Alguns de seus comandados participaram da ornamentação do fio. Um deles é o lateral-esquerdo João Pedro Soares dos Santos, de 16 anos. “Quando a minha chuteira rasgou, resolvi jogá-la no fio, mesmo não tendo outra. Poderia amarrá-la com esparadrapo para durar mais um pouco até comprar outra. Mas amarrei o cadarço e joguei. Fiquei feliz, muito feliz, pois é uma tradição do nosso time. Treinei uns cinco meses com chuteira emprestada, até comprar outra, mas alegre porque a minha velha está lá”, conta.

Leandro Couri/EM
Pedro Everton Evangelista Rodrigues, armador, da mesma idade, treina no Santa Lúcia há cinco anos. Para ele, jogar a chuteira no fio era questão de orgulho. “Eu ficava doido para a chuteira ficar velha, pra poder repetir o que o pessoal do time principal fazia. Quando ela rasgou, não tive dúvida. Foi no meio de um jogo. Assim que a partida acabou, corri pra debaixo do fio, tirei a chuteira, amarrei e joguei. Fiquei tão feliz, que nem tomei banho. Fui correndo pra casa contar pro meu pai, Alcimar, que também tinha jogado a dele. Ele ficou orgulhoso de mim”.

Não é só para os pequenos jogadores que o fio é motivo de orgulho. A aposentada Maria de Lourdes Amaral Figueiras, de 76 anos, que faz caminhadas no local, é uma admiradora do cenário: “Passo sempre por aqui e quando chego a esse local, paro e fico olhando. Muitas vezes, conto os pares, pra ver se aumentou. E o melhor pra mim foi ver que um passarinho fez um ninho numa delas. Isso aqui é uma obra de arte, um motivo pra alegrar a gente”.

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