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Vida dedicada ao Coelho

postado em 03/08/2011 07:00

Satyro Taboada foi um dos heróis americanos na conquista do decacampeonato mineiro, entre 1916 e 1925. Ídolo da época do futebol romântico, o atacante, que defendeu o clube de 1922 a 1931, é o maior artilheiro da história do América, com 165 gols, segundo dados do historiador Carlos Paiva. Até a sua morte, em 26 de julho de 1972, não cansou de proclamar seu amor pelo Coelho. “Nosso futebol está de luto. Satyro morreu” foi a manchete do Estado de Minas do dia seguinte.

“Ele merece mais que um minuto de silêncio, coroas de flores, lágrimas sentidas ou a bandeira verde do América sobre seu caixão”. Assim começava a reportagem sobre a morte do craque americano, que seria sepultado naquela quinta-feira no Cemitério do Bonfim. O texto destacava que para Satyro era rotina estar nas manchetes dos jornais. E citava uma de 28 de abril de 1930, após goleada do América sobre o Palmeiras por 13 a 0: “Satyro, ontem, estava com a viúva”. Ele havia marcado quatro gols e dado passe para dois.

Nascido em Belo Horizonte, em 19 de novembro de 1900, Satyro começou a carreira em 1916 ou 1917, no Sete de Setembro – nem seu contemporâneo e depois presidente do clube Raimundo Sampaio sabia precisar a data. Com bom físico e um futebol rápido e objetivo, Satyro trocou o clube do Horto pelo América em 1922 e não saiu mais. Nos primeiros anos, tinha a companhia do irmão Porfírio.

Ponta-direita na campanha do deca, Saint’Clair Valadares, também presidente do América em 1946 e da Federação Mineira de Futebol de 1937 a 1945, descreveu assim a maneira de atuar do companheiro: “Era desses jogadores peitudos, de muita coragem. Veloz e inteligente. Era uma espécie de pivô do América. Todas as principais jogadas de ataque convergiam sobre ele e os técnicos baseavam seus sistemas em suas avançadas. Satyro marcou gols memoráveis. Era perfeito no toque de bola e nas tabelas. Enfim, um jogador completo”.

Na última partida pelo campeonato de 1925, antes que os demais clubes desistissem da competição, o América goleou o Atlético por 4 a 1, em 14 de junho. Na época, Satyro Taboada já trabalhava na Secretaria de Segurança Pública como detetive, e, às vésperas do clássico, o secretário baixou portaria impedindo os policiais de jogar futebol. Segundo o EM, até o presidente do adversário, Alfredo Furtado, teria pedido para que a norma não entrasse em vigor antes do jogo.

NOVAS FUNÇÕES Depois de encerrar a carreira, o atacante passou a ser árbitro, em 1932. Raimundo Sampaio, que também se tornou árbitro, falou que “Satyro era um juiz enérgico, desses que expulsam por qualquer motivo. Não permitia indisciplina e, pela sua categoria, costumava dar algumas aulas para os dois times em plena arbitragem”. Ainda foi técnico do América anos depois. Posteriormente, dedicou-se inteiramente à profissão de detetive e ao emprego no Banco de Crédito Real. Também comandou o esquema de vigilância do Banco Comércio e Indústria.

Um dia antes de morrer, passou para uma das filhas (a mais nova tinha apenas quatro anos) as apólices de seguro que possuía e voltou a recomendar que queria a bandeira do América sobre seu caixão. “Nunca vi gostar tanto de um clube como meu pai. Lá em casa, não era permitido escolher um time para torcer”, contou a filha Tânia. “Papai passou sua vida toda no América. Ficava horas e horas revendo velhas fotografias e recortes de jornais.”

Na quarta-feira, dia 26, passou mal em casa pela manhã e morreu, vítima de infarto, na porta do Hospital da Previdência, curiosamente, bem perto do estádio do América, na Alameda. No sepultamento, Raimundo Sampaio não conseguiu continuar falando, quando começou a se lembrar dos tempos em que ambos eram garotos no Bairro Floresta. Quem também estava emocionado era o deputado Said Arges, ex-jogador do Atlético. “Sempre fomos inimigos dentro de campo. Mas, fora disso, nossa amizade era imensa. Sem ter frequentado ginásios, mesmo assim ele teve uma educação de catedrático. Foi um homem bom, justo e simples. Só deixou amigos.”

Cumprindo um desejo sempre expresso por Satyro Taboada, a bandeira branca do América não foi retirada quando a urna desceu à sepultura. “Durante toda sua vida, não se cansou de falar que queria ser enterrado com a bandeira do América”, lembrou a viúva, Raimunda.

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