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Entenda o intercâmbio de Brasil e EUA no futebol e no futebol americano

Apesar das diferenças entre a bola oval e a redonda, países têm trocado experiências e mão de obra

postado em 19/02/2017 06:00 / atualizado em 18/02/2017 19:31

Luis Nova/Esp. CB/D.A Press
Brasil e Estados Unidos são países que, indiscutivelmente, adoram futebol — cada um do seu jeito. Por aqui, a bola redonda é protagonista do esporte mais conhecido; por lá, o holofote fica na bola oval. Nos últimos anos, formatos à parte, as nações passam por um processo de intercâmbio envolvendo as duas modalidades. Enquanto o futebol americano tem crescido em nosso país, os americanos trabalham para difundir o nosso soccer.

O aumento de interesse pode ser mensurado. O futebol americano tem, no país, um calendário com duas competições nacionais organizadas por uma confederação. A Brasil Futebol Americano reúne 30 times em quatro conferências; a Liga Nacional, com 31 clubes, funciona como uma Série B; e há ainda uma série de torneios regionais país afora. Brasília é importante nesse cenário, com um time na elite, o Tubarões do Cerrado, e quatro na divisão de acesso: Brasília V8, Brasília Templários, Brasília Leões de Judá e Brasília Alligators.

A melhoria técnica das competições é diretamente influenciada pelo intercâmbio. A temporada 2016 das principais ligas teve a presença de 50 americanos nos campos — foram 61 estrangeiros no total, sendo 56 jogadores e cinco técnicos. Nenhum deles está, hoje, no Distrito Federal, mas os jogadores dos EUA contribuíram para o crescimento do Tubarões do Cerrado nas temporadas passadas.

Esse know-how também é aproveitado pela Confederação Brasileira de Futebol Americano (CBFA). O ex-jogador da liga universitária dos EUA Clayton Lovett, que hoje acumula os cargos de coordenador defensivo da Seleção Brasileira e de diretor de Desenvolvimento de Jovens, chegou ao país em 2010. “Eu trabalho para desenvolver o esporte e ajudar as pessoas a se tornarem melhores. Espero lançar projetos como um que fizemos em 2014, num fim de semana com clínicas, palestras e jogos com a presença do primeiro jogador da NFL nascido no Brasil, Leandro Veal”, diz Lovett.

A presença dos americanos nos times brasileiros ajuda no desenvolvimento do esporte em várias frentes, na visão do presidente da CBFA, Gustavo Sousa. “Agrega um nível técnico muito bom para as equipes. Quem joga futebol americano desde pequeno não só joga melhor, como pode ensinar aos outros. No marketing, só o fato de o jogador ser americano abre mais espaço diante do público e da mídia”, avalia.
 

Made in Brazil

 
O caminho inverso é testemunhado no soccer: os brasileiros marcam presença nas ligas norte-americanas de futebol. Vinte e dois atletas nascidos aqui atuam nas duas principais competições. São 12 na Major League Soccer (MLS) e 10 na United Soccer League (USL). Para efeito comparativo, as duas maiores ligas chinesas, mercado que tem feito uma limpa nos clubes nacionais, abrigam 36 brasileiros.

Exceção feita a Kaká, ex-capitão da Seleção Brasileira, a maioria dos atletas oriundos do Brasil é desconhecida. Isso pode ser explicado pelas limitações financeiras impostas pelas ligas americanas. Na última temporada da MLS, cada um dos 22 clubes pôde gastar no máximo R$ 11,4 milhões anuais com salários — cada jogador não pode receber mais de R$ 1,4 milhão por temporada, o que impede gastos milionários. Fogem à regra os jogadores designados, dois por equipe, que podem receber acima do teto. Nessa categoria, estão Kaká, Lampard e Gerrard, por exemplo.

Os resultados comerciais dos investimentos já começam a aparecer nos dois países. No futebol, a média de público da MLS superou a da Série A do Campeonato Brasileiro em 2016: 21.692 ante 15.200. No futebol americano, o interesse por aqui é cada vez mais alto. Mais de 2,1 milhões de brasileiros assistiram ao Super Bowl 51, no início do mês, segundo dados do Kantar Ibope Media.
 

Desafio estrutural

 
Paula Rafiza/Esp. CB/D.A Press
A falta de estrutura é a principal dificuldade dos clubes de futebol americano no Brasil. A maioria joga em campos de futebol adaptados. Em Brasília, os times começaram na Esplanada dos Ministérios. O Tubarões do Cerrado ainda faz seletivas no local. A saída encontrada é a parceria com universidades: Alligators, Templários e V8 treinam em espaços de centros de ensino da capital.

Um projeto da Confederação Brasileira de Futebol Americano (CBFA) em parceria com o Ministério do Esporte poderia amenizar essa carência, mas está parado. O Timbó Rex, clube de futebol americano de Timbó, cidade de 40 mil habitantes no interior de Santa Catarina, desponta em relação aos rivais. Em agosto de 2016, a equipe apresentou o projeto de uma arena exclusiva para o esporte, construção inicialmente orçada em R$ 1,3 milhão.
 

Invasão de escolinhas


A relação do Orlando City com o Brasil não se resume a ter um dono carioca e contar com Kaká no elenco. O clube americano abriu três escolinhas de futebol em território brasileiro, a primeira em Brasília, na 608 Sul. Ela começou a operar em setembro de 2016 e tem 110 alunos. “Além das aulas, fazemos campings, vêm professores de lá. E há os treinamentos nos Estados Unidos”, explica Márcio Heuser, sócio do empreendimento.

O trabalho já começa a dar resultado. “Em cada categoria deles, tem sempre ao menos um brasileiro. No sub-13, há um garoto que é de Brasília”, relata Márcio. O intercâmbio continua a nível universitário, no qual jovens tentam aliar o futebol com uma bolsa em universidades americanas. Eles se preparam no Brasil e lá têm hospedagem, treinamento com jogadores e técnicos das universidades parceiras, além de aulas de inglês preparatórias para o TOEFL e o SAT, testes de fluência exigidos pelas universidades americanas para concessão da bolsa.

Durante seis semanas, os participantes têm uma imersão na rotina de estudante-atleta. Para ajudar na aprovação, as empresas fazem o papel de empresários, editando vídeos dos melhores momentos dos candidatos e os enviando a treinadores.

Três grupos de atletas já foram aos Estados Unidos pelo programa da Team Brazucas, uma das agências que funciona em Brasília. Todos os 11 que viajaram nas duas primeiras levas receberam propostas de universidades. Sete ficaram no país. Um deles é Vinicius Gonzalez, zagueiro de 19 anos, que estuda administração em esportes na St. Thomas University, em Miami Gardens, na Flórida.

O beque de 1,82m exalta o futebol em solo americano. “Precisamos aprender bastante com eles, principalmente com o sistema de treinamento, que é muito profissional, bem organizado”, relata.

*Estagiário sob supervisão de Braitner Moreira