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RIO-2016

Com toda a reverência: dos 11 medalhistas brasileiros, nove são das Forças Armadas

Eles recebem salário de R$ 3,2 mil para se dedicar ao esporte

postado em 17/08/2016 08:27 / atualizado em 17/08/2016 08:33

Fernando Jordão - Especial para o Correio

Pascal Guyot/AFP

Um gesto pode dizer muita coisa. Sobretudo quando feito num pódio olímpico, momento especial na carreira de um atleta e que, certamente, estará sendo assistido por milhões de pessoas. Os velocistas norte-americanos Tommie Smith e John Carlos sabiam disso quando subiram para receber suas medalhas descalços, com meias pretas e luvas trajando os punhos erguidos e cerrados, nos Jogos do México, em 1968, para protestar contra a discriminação racial nos Estados Unidos.


Quarenta e oito anos depois, um gesto bem mais simples — e muito menos político — tem chamado a atenção na Olimpíada do Rio. Alguns atletas brasileiros têm prestado continência após serem condecorados. O motivo? Eles são integrantes do Programa Atletas de Alto Rendimento (Paar) do Ministério da Defesa. Dos 465 integrantes da delegação brasileira, 145 são militares.


Criado em 2013, o projeto tem números impressionantes: das 11 medalhas que o Brasil tem até o momento na Rio-2016, nove foram conquistadas por atletas militares e ao menos mais uma já está garantida no vôlei de praia feminino, já que duas duplas de militares chegaram às semifinais da disputa.

Para participar do programa, não é preciso ser militar de carreira. A seleção é feita por meio de editais — em média, são lançados dois por ano. Os atletas passam por uma prova de títulos, que inclui uma análise de seus desempenhos em competições e suas posições nos rankings de cada modalidade. Se aprovados, ganham uma patente (geralmente de sargento), um soldo (salário) de R$ 3,2 mil, com 13º, e o direito de desfrutar de toda a estrutura esportiva das Forças Armadas. Além disso, têm direito a atendimento médico, odontológico, nutricional, fisioterápico e psicológico. Todos esses benefícios podem se estender por um período máximo de oito anos.


Atualmente, 670 atletas participam do projeto, o que gera um custo anual de R$ 18 milhões ao Ministério da Defesa. Primeiro medalhista do Brasil na Rio-2016, Felipe Wu é um deles. O atirador conta que ingressou no programa por não ter conseguido outra forma de incentivo financeiro. “Na minha modalidade, praticamente todos os atletas e dirigentes são militares. Então, quando saiu um edital em 2013, eles me avisaram, e eu me inscrevi”, lembra, em entrevista ao Correio. Ele acrescenta que, se não tivesse se tornado militar, não poderia ser atleta de tiro esportivo, já que, por ter menos de 25 anos, não pode obter o porte de arma.


Sobre a continência que prestou no pódio, Wu nega ter recebido qualquer orientação para fazê-la. Ele também descarta a possibilidade de o gesto ter sido uma forma de agradecimento às Forças Armadas. “Até porque eu os agradeço sempre que posso”, justifica. “Cada um faz o que se sente confortável. Eu fiz de maneira voluntária. Foi uma forma de demonstrar respeito.”

Críticas

O programa do Ministério da Defesa foi criticado por Marcos Goto, técnico de Arthur Zanetti, prata nas argolas e um dos atletas militares em ação na Rio-2016. “São militares? Ou são atletas que são militares? Eles não treinam lá, só são contratados por eles. Eu que dou treino para o meu atleta, não são militares”, disparou, após a conquista de Zanetti. “Gostaria que os militares fizessem um trabalho de base, tiraria o chapéu para eles. Agora, apoiar atleta de alto nível é muito fácil.”


Sem mencionar o treinador, o Ministério da Defesa respondeu, em nota, que “além do Programa Atletas de Alto Rendimento, desenvolve, em parceria com os ministérios do Esporte e do Desenvolvimento Social e Agrário, o projeto social Forças no Esporte (Profesp), que beneficia cerca de 21 mil crianças e jovens em situação de vulnerabilidade social”.


Ontem, o próprio Goto minimizou sua declaração, afirmando que não fez, “de jeito nenhum”, uma crítica ao trabalho desenvolvido pela pasta. “Não fiz queixa, dei minha opinião. Hoje (ontem), fiquei sabendo que existem alguns projetos que fomentam o esporte. É uma alegria saber disso”, concluiu.

Militares medalhistas

Rafaela Silva
ouro no judô


Thiago Braz
ouro no salto com vara


Robson Conceição
ouro no boxe


Felipe Wu
prata no tiro esportivo


Arthur Zanetti
prata na ginástica artística


Arthur Nory
bronze na ginástica artística


Poliana Okimoto
bronze na maratona aquática


Mayra Aguiar
bronze no judô


Rafael Silva
bronze no judô