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Entrevista: Alex comenta fim do Bom Senso e defende técnicos brasileiros

Ex-jogador reclama de 'sociedade egoísta', critica imprensa e põe elenco do Cruzeiro à frente do Palmeiras

postado em 18/08/2017 06:00 / atualizado em 17/08/2017 18:25

Bárbara Cabral/Esp. CB/D.A Press
Considerado o maior jogador da história do Fenerbahçe, da Turquia, e ídolo de Coritiba, Palmeiras e Cruzeiro, o ex-jogador Alex criticou a postura dos jogadores do futebol brasileiro pela falta de continuidade do Bom Senso, movimento criado em 2013 em busca de melhores condições para os atletas do país, e que tinha o meia canhoto como um dos principais personagens.

Em entrevista ao Correio, em Brasília, ele criticou a importância que a imprensa nacional dá para os times de Rio de Janeiro e São Paulo, enquanto ignora bons trabalhos feitos em Minas Gerais e Rio Grande do Sul. Campeão brasileiro com o Cruzeiro em 2003, Alex acredita que o elenco celeste atual é melhor que o do Palmeiras, clube onde o ex-camisa 10 conquistou a Libertadores da América, em 1999.

Hoje comentarista e com a vida toda ligada ao futebol, Alex não pretende largar a modalidade. Ele não descarta, inclusive, trabalhar como dirigente ou treinador. Veja a entrevista completa com o ex-jogador, que está em Brasília para divulgar o Futebol City, evento de futebol que ficará no Parque da Cidade em outubro.

Por que o Bom Senso acabou?

Acabou da forma que eu imaginava, a participação do jogador é fundamental e, caso ele não queira participar, acaba. Enquanto tinha quem desse a cara, o Bom Senso continuava, mas aí alguns pararam, saíram ou sofreram retaliações nos clubes, daí o movimento diminuiu.

Acha que a força do movimento pode voltar?

Não sei. Eu não jogo mais, não sinto mais na pele o que eles sentem. Eu me sinto ofendido, mas não me atinge diretamente. Eu fiz muito quando estava em atividade, se quiserem minha ajuda de alguma forma, estou aberto. Os jogadores é que têm que responder, eles ainda jogam, ainda sofrem.

Os jogadores são culpados pelo fim do Bom Senso?

Eles são responsáveis por muitas coisas. Mas não só eles, mas várias gerações anteriores, como a minha. Vivemos em um mundo egoísta: se não te atinge, não interessa. É um mal da sociedade, não acontece só no futebol.

Pensa em ser dirigente, treinador?

Eu adoro futebol, penso sim. Não consigo me dissociar disso. Eu casei com a filha de um ex-dirigente (Alex é casado com Daiane Mauad, filha do ex-presidente do Coritiba, Edison Mauad). Penso em ser dirigente, é uma área que me interessa e me incomoda, não me vejo em uma situação longe do esporte. Mas, agora, estou me dedicando aos meus filhos, não consigo fazer as coisas meio termo, não dá para dividir.

Se virar técnico, pode ter a concorrência de técnicos estrangeiros. O que pensa sobre isso?

Não tenho nada contra. Eu morei fora, fui estrangeiro e muito bem tratado, também já tive treinador de fora, não vejo problema nisso. Eu acredito em qualidade, ou você tem ou não tem, não olho para a nacionalidade.

Muitos criticaram o Flamengo pela contratação do Rueda…

Ele fez um bom trabalho lá no Atlético Nacional, vai fazer aqui? Não sei, é uma outra cultura. Paulo Bento é um mau treinador? Não, mas deu errado, (Ricardo) Gareca funciona na seleção peruana. Temos que dar tempo para ele, não sei qual é a ideia do Flamengo, mas acredito que, se ele tiver o ano inteiro de 2018, pode funcionar.

Estamos vivendo uma safra ruim de treinadores no Brasil?

Não. O futebol brasileiro está como está e só piora porque não se treina. Não tem tempo, só se joga. A discussão da qualidade técnica do nosso futebol começa pelo calendário. Se você não repete movimentos, você não melhora. Temos técnicos, não temos tempo. Qual treinador brasileiro conseguiu trabalhar, de verdade, nesse ano? O Corinthians foi quem mais teve tempo, as pessoas ficam superanimadas, mas vai durar quanto tempo? Nós só nos preocupamos com a vitória do nosso time no domingo. Qual treinador tem moral no Brasil? A imprensa batia até no Telê Santana, chamava ele de pé-frio. Não tem gol de jogada ensaiada porque não treina, não tem gol de falta porque não treina.

Você agora trabalha na imprensa…

Reprodução/Instagram
A imprensa é um torcedor que tem poder de falar no microfone. O cara da imprensa não tem muito mais conhecimento que o cara que está na arquibancada, essa é a realidade. ‘Mas eu sou jornalista, isso me torna mais conhecedor que você’, não! Isso te torna jornalista. Vejo vários por aí falando em números, queria ver essas pessoas com 22 coletes na mão e tendo que entregar resultado no fim de semana. A imprensa não têm responsabilidade nenhuma, depois diz que errou e pronto. É melhor o torcedor formar a própria opinião do que mudá-la após ouvir um comentarista.

Você jogou em Flamengo e Palmeiras, eles desapontaram em 2017…

Desapontaram por quê? Para mim, o time do Cruzeiro é melhor que o do Palmeiras, mais equilibrado. O Palmeiras gastou mais, mas e daí? Foram campeões brasileiros sem jogar bem, só tinham vontade, mas não era bonito. O Flamengo gastou, gastou... Mas existe diferença entre contratação e reforço, só sabemos se é reforço mesmo quando o cara entra em campo. O Conca tem problema físico, nem joga, vão falar que ele fracassou no Flamengo, mas mal entrou em campo…

No Palmeiras, tem o Borja…

É outro exemplo, a imprensa vendeu ele como um grande centroavante, um goleador, parecia que estava chegando um cara com 300 gols na carreira. Ele é goleador? Não é. Goleador éramos eu, Romário, Zico. Ele é bom jogador, mas a imprensa vendeu ele como o novo Evair, o novo Careca. É bom jogador, mas venderam ele como se fosse um grande artilheiro desde o dia que nasceu, e não é.

Acha que a imprensa trata diferente os times do Rio e São Paulo?

No Brasil, tudo que vem de São Paulo ou Rio é melhor que Minas ou Rio Grande do Sul. Eu posso falar, já joguei no Cruzeiro e sei como é. Meu Cruzeiro passeava, ganhava de qualquer um passeando, e os caras insistiam que o Santos ia ganhar da gente. As pessoas têm, até hoje, dificuldade em falar que o Cruzeiro teve os três melhores times da era dos pontos corridos (2003, 2014 e 2015). O Corinthians do Tite também passeava, mas só insistem em lembrar deles. Mas quem viu sabe.

O camisa 10 igual a você está em extinção? Acha que hoje em dia teria mais chance na Seleção?

Não tem igual a mim, o que mais se aproxima é o Thiago Neves, do Cruzeiro, que é decisivo, faz seus gols. A função que eu fazia está quase extinta. Seleção eu não sei, dependeria da preferência do Tite. Na minha época, acho que a concorrência era maior. Concorri com três caras que levaram a Bola de Ouro da Fifa: Ronaldinho, Kaká e Rivaldo. Ainda assim, vou morrer achando que poderia ter atuado no mesmo nível deles na Seleção.

O que mudou no futebol brasileiro desde que você voltou da Europa?

Quando voltei ao Coritiba, em 2013, fiquei assustado com dois caras abertos, fazendo uma função que o lateral fazia. 

Como Everton, do Flamengo e Róger Guedes, do Palmeiras?

Esses dois ainda jogam bola. Mas eu olho pro Romero, do Corinthians, ele é marcador de lateral. Eu não sei em que posição ele jogava antes, mas hoje ele é marcador de lateral. O Rildo, do Coritiba, que eu assisto muitos jogos, também é.
 
*Estagiário sob a supervisão de Braitner Moreira