Vida Esportiva

VIDA ESPORTIVA

Adrenalina: entenda o processo do hormônio presente nos esportes de risco

Adeptos de modalidades arriscadas aprendem a manter a serenidade em situações de perigo e têm o medo como aliado para aumentar a atenção e evitar erros

postado em 28/03/2015 16:08

Jéssica Raphaela /Correio Braziliense

Arquivo Pessoal
No alto do helicóptero com a porta aberta, a 2 mil metros do chão, o coração acelera, as mãos suam, e os músculos se tensionam. É a adrenalina, que percorre a corrente sanguínea a cada novo salto de paraquedas. A sensação se repete na ponta de um penhasco, a cada movimento de escalada em uma montanha e em cima de uma prancha que flutua sobre ondas gigantes. Coisa de doido? Longe disso. Aficionados por esportes radicais demonstram calma em momentos nos quais a morte é um risco frequente.

Estar disposto a se jogar do céu exige muita sanidade. “Não há nada de patológico com pessoas que gostam de atividades radicais”, assegura Renato Miranda, doutor em psicologia do esporte e autor do livro Reflexões do esporte para o desempenho humano (Editora CRV, 2013). Segundo ele, o perfil psicológico de quem pratica esportes de aventura é o oposto do que se imagina. “São pessoas destemidas, mas centradas, cuidadosas. Elas precisam da calma para lidar com as situações de risco. Como o perigo está rondando o atleta permanentemente, requer muita preparação psicológica”, explica Renato.

O medo não deixa de existir, apenas se torna controlável. Vice-campeão mundial de wingsuit, o brasiliense Yuri Cordeiro tem o temor como aliado. Como qualquer erro pode ser fatal, é esse sentimento que o mantém alerta a tudo na prática. “Já não é mais um medo absurdo, transformou-se num cuidado, num alerta. Preciso planejar até os mínimos detalhes para que não termine em tragédia”, conta Yuri, que mora no Rio de Janeiro e tem a Pedra da Gávea como principal ponto de treinamento.

Se, ao chegar ao topo da montanha, as condições de tempo não forem favoráveis, Yuri desiste do salto sem pestanejar. “Não é uma brincadeira, algo que eu possa banalizar”, ressalta o atleta. Somente essa segurança é capaz de tornar o esporte prazeroso. O encantamento das modalidades radicais advém do controle sobre situações nas quais o risco de morte é iminente. Os atletas não controlam o perigo em si, mas desenvolvem habilidades para enfrentá-los.



Ter plena consciência durante a atividade esportiva é algo que só se consegue com a prática. Um surfista de ondas gigantes iniciante, por exemplo, recebe uma descarga de adrenalina muito maior do que um atleta mais experiente. O corpo se adapta até às situações de risco, e isso é benéfico, pois o medo incontrolável dá lugar a uma atitude mais consciente, conforme explica o fisiologista do exercício Guilherme Pontes. “A pessoa não pode estar emocionalmente abalada, porque pode incorrer em erro. Quando o corpo se adapta, ela deixa de agir pelo instinto e toma decisões inteligentes”, sustenta.

Corpo em equilíbrio
A sensação causada por uma atividade radical está longe de ser “adrenalina pura”. O corpo busca se manter equilibrado, mesmo em uma situação adversa. O sistema nervoso aciona a produção de diversas substâncias que, juntas, resultam no bem estar. A adrenalina é apenas uma delas. Produzido pelas glândulas suprarrenais, o hormônio prepara o corpo para fugir ou atacar, acelerando o coração e fortalecendo os músculos, por exemplo.

O hormônio responsável pela ação é a noradrenalina. É ela que faz com que a pessoa tenha ímpeto de agir. Além desses dois agentes, o esforço árduo faz o corpo produzir substâncias como a dopamina e a endorfina (causam bem-estar e estão presentes em diversas atividades físicas), serotonina e cortisol (que deixam o corpo alerta). “Essa combinação de neurotransmissores, responsáveis por ação, reação e recuperação, causa sensação de alegria intensa, motivação e recompensa”, resume o especialista em psicologia esportiva Renato Miranda.

Asas artificiais
Modalidade do paraquedismo, o wingsuit consiste no salto com um traje especial, dotado de membranas. A roupa faz o atleta planar e alcançar altas velocidades. O salto pode ser feito de um avião ou de estruturas fixas, como montanhas e prédios. Para pousar, o praticante aciona o paraquedas e retorna ao chão. Considerada uma dos modalidades mais perigosas do mundo, o wingsuit ganhou notoriedade em 2013, quando pelo menos 15 pessoas morreram durante a prática.