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COLUNA DO JAECI

Amo os gênios da bola. Detesto os jogadores atuais

A maioria é estragada por tanta bajulação e por falta de berço. Não troco o berço que tive por dinheiro nenhum desses caras que saíram da favela, mas a favela não saiu deles

postado em 23/12/2018 12:29

AFP PHOTO / MICHELE LIMINA
Liguei para Zico (foto), amigo de três décadas e meu ídolo, logo após a derrota do Kashima Antlers para o Real Madrid, na quarta-feira, em Abu Dhabi, Emirados Árabes. Sempre gentil, me atendeu, e fiz uma entrevista que foi ao ar no mesmo dia na Rádio Tupi do Rio de Janeiro, no programa Giro esportivo, no qual tenho um comentário diário: “Não perca a Esportiva, com Jaeci Carvalho”. Vejam, senhoras e senhores, Zico, diretor esportivo do clube japonês, acabara de ser eliminado do Mundial Interclubes, mas me atendeu como se tivesse vencido, com toda a tranquilidade e elegância. Por isso amo os jogadores do passado e detesto os atuais. Zico, Cerezo, Falcão, Reinaldo, Júnior, Casagrande, enfim, todos dessa geração são atenciosos, gostam da imprensa e se tornaram nossos amigos. Foram gênios da bola, mas jamais mascarados. Apareciam nas notícias esportivas, não em revistas de moda, pintando o cabelo ou em eventos que não esportivos.

Por isso sou saudosista e tive a felicidade de ver e conviver com os grandes craques que encantaram o Brasil com futebol de alto nível. Muita gente diz que o Brasil não ganhou a Copa de 1982 e perdeu para uma Itália fraca. Enganam-se. O time italiano era tão genial quanto. Tinha Dino Zoff, um gigante no gol, Scirea, Bergomi, Cabrini, Tardelli, Bruno Conti, Graziani e Paolo Rossi, que meteu três gols na gente. Era um timaço também. O Brasil tinha a vantagem do empate, mas nossos craques não sabiam e não podiam jogar pelo resultado. Queriam mostrar a arte, a genialidade, embora isso custasse a eliminação. Não à toa, essa Seleção está na história como uma das três melhores de todos os tempos. As de 1994 e de 2002 não estão. Viram a diferença?

Hoje, os caras ficam milionários no primeiro contrato, andam mudando a cor do cabelo e os cortes a cada semana e aparecem somente nas revistas de moda, nos eventos e nas manchetes de colunas sociais. Estão mais preocupados em aparecer ao lado de artistas do que em jogar bola de verdade. Dizem que são os novos tempos. Eu prefiro os tempos antigos. Vou cometer uma inconfidência aqui neste espaço. Estávamos eu e meu irmão Galvão Bueno, no CT do Tottenham, antes da Copa da Rússia, assistindo a um treino do Brasil, quando os jogadores vieram juntos, fazendo uma corrida. Quando viram a gente, viraram a cara para o outro lado. Como somos críticos e não os bajulamos, sentem-se injustiçados. Os jogadores de outrora eram criticados e elogiados na mesma proporção, mas entendiam nossa profissão e não deixavam de ser nossos amigos. Eram respeitados e nos respeitavam. Por isso foram vencedores e têm história até hoje. Graças a Deus, já há um bom tempo sou colunista e não preciso entrevistar ou estar perto dos jogadores de hoje. Não suporto mais esses caras. Claro que há as exceções – em toda regra há –, jogadores que continuam humildes, bacanas, que reconhecem que sempre precisaram da imprensa para aparecer nas páginas ou programas esportivos. Porém, a maioria é estragada por tanta bajulação e por falta de berço. É aquilo que escrevo há anos: não troco o berço que tive por dinheiro nenhum desses caras que saíram da favela, mas a favela não saiu deles.

Por isso, enquanto eu estiver trabalhando no futebol, vou sempre idolatrar e elogiar os gênios que vi jogar. Não sou amigo do Gérson, “o canhota de ouro”, que trabalha na Rádio Tupi. Porém, é como se fosse, tamanha a identificação que tenho com os comentários dele. Um cara simples, que foi genial com a bola nos pés, humilde, que conhece futebol como poucos. A Gérson, Rivellino, Zico, Reinaldo, Éder, Cerezo e tantos outros, o meu muito obrigado. Vocês me ensinaram a amar o esporte bretão de verdade, não esse que se pratica hoje. A arte, a genialidade, o toque, o drible, o gol. Vocês davam espetáculo. Vocês chamavam a bola de “amor”. Sim, sou saudosista, e quem não gostar que não me leia. Estou pouco me lixando. Gosto de coisa boa, não do lixo. E o que dizer do Rei Pelé, que me tirou da classe executiva de um voo da British, me pôs na primeira classe para me dar uma entrevista exclusiva em pleno voo? Só posso dizer muito obrigado, Rei. Você é incomparável, inigualável, mas é um ser humano fantástico, maravilhoso, que honrou e honra o futebol brasileiro até hoje. Obrigado a todos vocês.

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