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Do papel à realidade: menina realiza sonho de ser jogadora do Sport após carta aos pais

Hoje, Gabrielle dos Santos, com 15 anos, além de ser a jogadora mais nova da Série A1, é tratada como promessa do futebol feminino do Rubro-negro

postado em 20/05/2019 09:30 / atualizado em 20/05/2019 09:28

<i>(Foto: Mandy Oliver/Esp. DP Foto)</i>
"Da luta vem a vitória. Papai e mamãe, eu sei que alguém vai me colocar no Sport, porque eu vou treinar muito para conseguir”. Foi com estas palavras, ditas em carta deixada embaixo do travesseiro dos pais, que Gabrielle Luiza Faria dos Santos, com apenas oito anos de idade, deu os primeiros passos rumo ao sonho de infância: ser jogadora de futebol. Não de qualquer clube. Mas vestindo a camisa do Rubro-negro pernambucano, o sonho sairia da imaginação para se tornar realidade. 

Para dar voz ao desejo, foi preciso Gabi deixar a timidez de lado e contar a Márcio dos Santos e Haydee Luiza que tinha um sonho. “Eu sou tímida para falar, me expresso mais escrevendo. Quando escrevo, me sinto melhor do que falando pessoalmente. Escrevi porque nem toda menina tem o sonho de ser bailarina, e sim jogadora de futebol. E eu quero isso para minha vida”, explicou.

Assim que os pais leram a carta da filha, a primeira sensação foi o susto. Márcio e Haydee pensaram nas dificuldades do futebol feminino. Mas logo depois veio a aceitação. E o apoio incondicional. Porque “um sonho não se adia”.

“Ficamos um pouco assustados quando vimos. Perguntamos se era isso que ela queria, e ela falou que sim. Até hoje a gente está nessa luta. Sempre apoiamos, nunca fomos contra. É um sonho. E a gente tem que ajudar a realizar os sonhos dos nossos filhos. Sonho não se adia, principalmente dos filhos”, contaram. 

Hoje, com 15 anos de idade, Gabrielle vive esse sonho. Passados sete anos após o pedido em carta para realizar seu maior desejo, a menina é tratada como a jovem promessa do Sport e integra o elenco profissional feminino do Rubro-negro, que disputa o Campeonato Brasileiro, sendo a jogadora mais jovem das 16 equipes que disputam a competição. No clube desde o início de 2018, deixou de ser Gabrielle Luiza para se transformar em Gabi Santos, a atacante camisa 31 do Leão. Porém, antes de jogar no time de infância, a caminhada foi árdua.

Da luta  

A falta de equipes femininas em Pernambuco para dar início à sua trajetória no esporte fez com que o pai, ex-jogador de futebol - passou por América-PE, CRB, Botafogo-PB - se tornasse seu grande mentor.  No início da carreira de Márcio no futebol, Gabi, com apenas aos oito anos de idade, era quem o acompanhava aos treinos e partidas. Assistia a todos os jogos. “Os meus colegas começaram a gostar tanto dela que, quando eu não trazia para os jogos, o pessoal reclamava”, relembra, aos risos, Márcio. 

Desde então, dos nove aos 12 anos de idade, foi ele o responsável por treinar a filha. De manhã ou à tarde, quatro vezes por semana, alternava os treinamentos com a menina na Praia do Janga ou no Clube da Caixa, de onde um amigo é proprietário e cedia o campo. Mas após o nascimento de Isabelle, irmã de Gabi, Márcio teve que se ausentar dos gramados - e do acompanhamento integral no futebol da filha - e foi trabalhar em um meio mais viável financeiramente. Hoje, ele e Haydee são donos de uma pequena loja de bolos no Janga.  

Foi a partir daí que a primeira oportunidade de Gabi Santos jogar profissionalmente - e entre mulheres - aconteceu. Logo no rival do Sport, o Náutico. Em 2018, à época com 13 anos, treinou no Alvirrubro por três meses. Mas não chegou a disputar uma partida oficial pelo clube porque o Criciúma-RS fez uma proposta e a menina seguiu rumo ao Sul do país. No time catarinense ficou três meses e de lá foi convocada para jogar futsal na categoria sub-14 pela Confederação Brasileira de Desportos Escolares (CBDE) e conquistou o vice-campeonato Sul-Americano, no Peru. Em seguida, retornou ao Tigre, mas por pouco tempo. 

O Sport chamou Gabi para integrar o elenco do futebol feminino. Ter a chance de ficar próxima da família e jogar, finalmente, pelo time do coração fizeram a garota não pensar duas vezes: voltou ao Recife. 

Contato que foi intermediado através de Keila Felício, atual treinadora do time feminino do Leão. Na época do convite, o clube pernambucano havia fechado o departamento do futebol feminino. Mas em seguida voltou atrás e criou um time para disputar o Campeonato Brasileiro.  “Ano passado eu vim fazer uma peneira no Sport, e ‘Keylinha’ me chamou. Eu já a conhecia ela antes. Na peneira, eu passei. Quando se desmontou o time daqui e montaram de novo, ela me chamou para jogar o Brasileiro e o Sub-18. Foi uma sensação boa, um sonho realizado, mais um”, descreveu Gabi.  
<i>(Foto: Mandy Oliver/Esp.DP Foto)</i>

Vem a vitória 

Como atleta profissional, a rubro-negra disputou sua primeira partida oficial na carreira contra o Internacional, pela sexta rodada da Série A1 deste ano. Gabi estreou no segundo tempo, jogou bem, mas não teve a oportunidade balançar as redes. Para quem se dedica tanto - dentro e fora dos gramados -, uma questão de tempo, apenas.  

A rotina é a mesma, de segunda a sábado. Antes do sol nascer, às 4h30 manhã, Gabi acorda e segue para o Sport junto com os pais. O treino começa às 8h, mas a jovem atacante faz questão de chegar mais cedo. Bem mais cedo, na verdade. Às 7h, Gabi já marca presença no campo auxiliar do Leão. Todos os dias, é a primeira do elenco a chegar. Mas engana-se quem pensa que quando não tem treino ela deixa a dedicação de lado. Acorda um pouco mais tarde pela manhã, mas segue com o pai e vai treinar na praia do Janga.

Trabalho árduo reconhecido pela treinadora, ‘Keilynha’, como é carinhosamente chamada pela jogadora. “Impressiona a forma dela atuar, como se ela já fosse profissional. Gabrielle tem essa responsabilidade de querer crescer. E a qualidade ela já tem, que tecnicamente ela é muito boa. Ela é uma das melhores atletas que a gente tem”. 

Inspirada no futebol de Marta, Gabi Nunes (atacante do Corinthians) e Philipe Coutinho, a jovem promessa do Sport sabe que está apenas dando os primeiros passos. De transformar o sonho, não só dela, mas também dos pais, escrito em carta, em realidade. E tem na ponta da língua a resposta sobre qual o seu futuro: “ser Gabi Santos, atacante da Seleção Brasileira”.  

Confira, na íntegra, a carta de Gabi: 

Papai e mamãe, meu sonho sempre foi ser uma jogadora de futebol, mas eu não vou desistir de ser uma jogadora, porque se eu tentar eu vou ser. Porque a primeira frase é seja feliz e a segunda é: nunca se desiste. Porque depois de tanta luta vem a vitória. Eu sei que alguém vai me colocar no Sport porque eu vou treinar muito para conseguir e eu sei que um dia vou realizar meu sonho , porque é esse sonho que eu quero e é esse sonho que eu vou ter sempre.