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Brasileiros que cometeram assédio na Rússia estão sujeitos a sanções como multa e expulsão do país

Advogado especialista em Direito Internacional comentou à reportagem o que a lei prevê para os casos de insulto e assédio cometido por brasileiros

postado em 20/06/2018 20:30 / atualizado em 20/06/2018 21:31

Reprodução
Os brasileiros envolvidos em casos de assédio sexual e insulto na Rússia estão sujeitos a sanções como pagamento de multa e expulsão do país. O Superesportes ouviu o advogado especialista em Direito Internacional, Dorival Guimarães Pereira Júnior, que comentou os cenários possíveis nesses episódios. Segundo ele, existem três medidas administrativas previstas para os ofensores: expulsão, deportação e extradição. Na situação dos brasileiros, a primeira é a que se encaixa melhor.

“A expulsão nesse caso é a que se encaixaria melhor. É quando aquele indivíduo estrangeiro, por algum motivo, atenta contra a segurança nacional ou contra algum princípio do Estado. É um ato administrativo do país para se resguardar contra quem ele quiser ou achar necessário. A deportação está ligada à irregularidade documental, o que não é o caso desses brasileiros, que preencheram os requisitos para ingressar no país. E tem a extradição, que é quando o indivíduo comete um crime num determinado estado e este o entrega a outro estado. Também não se aplica a essa circunstância”.

O advogado não se arrisca a cravar que a Rússia expulsará os brasileiros de seu território, embora exista pressão por parte de ativistas, que criaram um abaixo-assinado na internet e pediram punição por parte do governo local.

“Se a Rússia entender isso, poderá tomar as medidas cabíveis para estrangeiros. Cada país tem seu ordenamento jurídico e sanções determinadas para estrangeiros. Porém, por mais restritos que seja o sistema, acaba sendo um pouco relativizado nesse momento. Embora a Rússia possa ter um sistema duro, ela está se mostrando para o mundo com a realização da Copa e talvez mostre uma postura conciliadora”, disse Dorival. “Pelo que vimos até agora, não se configura em crime, mas em pagamento de multa. Por isso, os brasileiros não seriam expulsos”, acrescentou.

Conforme esse abaixo-assinado, os brasileiros estariam suscetíveis, em caso de denúncia e condenação, ao pagamento de multa de até 3 mil rublos (moeda russa), cerca de R$ 175. A conduta fere os artigos 5.6.1 do Código de Ofensas Administrativas (insulto, isto é, honra e dignidade de outra pessoa, expressa na forma indecente) e 20.1 do Código Administrativo (vandalismo mesquinho – isto é, por violar a ordem pública, expressando desrespeito claro pela sociedade, acompanhado por linguagem chula em locais públicos e abuso sexual ofensivo para os cidadãos).

Os causadores dos insultos também podem ser impedidos de entrar em outros países, se as autoridades competentes tomarem conhecimento do ocorrido e considerarem inadequada a postura desses indivíduos. 

“Os atos desses brasileiros são abomináveis em qualquer lugar no mundo. No Brasil poderia ser crime, mas não foi cometido aqui, e sim fora do país. Porém, houve transmissão dos vídeos por meio de mensagens, o que gera um impacto que não é apenas nacional. Esse ato pode ter repercussão negativa em vários países. Imagine que essa mensagem chegue até Portugal ou Itália. A depender do que cada ordenamento jurídico reconhece, os brasileiros poderiam sofrer medidas administrativas em países nos quais eles jamais pisaram. Poderiam, inclusive, ser proibidos de entrar no território dessas nações”, observou o jurista.

Com relação ao papel do Consulado Brasileiro na Rússia, Dorival Guimarães explicou que o órgão serviria para prestar assessoria aos brasileiros – isto é, se a Justiça da Rússia aplicar algum tipo de pena. “A função consular é apropriada para essa questão. O consulado tem esse poder de defender os interesses brasileiros. Ainda que o ato seja reprovável, o consulado poderia oferecer assistência jurídica, tradutor, etc. Ou seja, os responsáveis pelas ofensas teriam o direito de se defender normalmente”.

E para os casos serem considerados ilícitos penais, não é preciso que as pessoas ofendidas façam denúncias. “Mesmo que o indivíduo não tenha se sentido ofendido no momento, por não conhecer o idioma português, é um ato repudiável. A imagem das pessoas foi divulgada para o mundo inteiro e entendida como ofensiva”.

Punição no Brasil?

Do ponto de vista criminal, os autores dos assédios não devem ser autuados no Brasil. Porém, órgãos como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a Polícia Militar já preparam medidas punitivas amparadas pela lei. “Nos casos que foram ao conhecimento do público havia pessoas ligadas a essas instituições. Como são atitudes incompatíveis com o exercício da profissão, a autoridade administrativa responsável tem o direito de aplicar uma sanção”, explicou Dorival Guimarães, que recomendou aos milhares de brasileiros que estão na Rússia a respeitar a cultura e os costumes locais.

“Não apenas na Rússia, mas em qualquer lugar do mundo. As pessoas têm de ter bom senso, não podem passar dos limites. Precisam compreender que cada país tem seu ordenamento jurídico e saber respeitá-lo”.

Consulado russo em BH

A consulesa da Rússia em Belo Horizonte, Carolina Bernardes Enham, lamentou os episódios de assédio e espera que o respeito prevaleça entre brasileiros e russos. “A exigência desse tipo de respeito é global. A embaixada da Rússia aqui no Brasil está em conversa com a embaixada do Brasil lá na Rússia para tentar reportar e identificar esses brasileiros. Os brasileiros que cometeram o assédio estão sob responsabilidade da embaixada brasileira. A nós cabe fazer apenas essa recomendação e prestar o nosso repúdio a esse tipo de comportamento. Nós somos bem recebidos pelos brasileiros, conseguimos trabalhar no Brasil de forma muito proveitosa, de muita amizade. Queremos que o mesmo ocorra lá”, disse.

“Não queremos que os brasileiros de modo geral sofram alguma retaliação. Se esse tipo de comportamento evoluir lá, a coisa pode ficar complicar. E é tão simples de resolver, né?! Só não confundir festa com desrespeito, pois não combinam. Os brasileiros têm receptividade enorme por parte dos russos. Os brasileiros estão descobrindo o quanto os russos são festivos, carismáticos, abertos, muito parecidos com os brasileiros em termos de serem festivos”, acrescentou a consulesa.

Os episódios que vieram a público

Os casos de assédio e insultos vieram a público por meio de vídeos compartilhados nas redes sociais. Num dos incidentes, seis homens induzem uma mulher estrangeira, que não conhecia o idioma português, a falar palavras obscenas referentes à cor de seu órgão sexual. O caso ganhou grande repercussão na imprensa brasileira. O primeiro identificado foi o advogado Diego Valença Jatobá, ex-secretário de Turismo, Esporte e Cultura de Ipojuca, no Litoral Sul de Pernambuco. Ele exerceu o cargo durante a gestão do prefeito Pedro Serafim (PDT) e já foi condenado pelo Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco (TCE-PE), em 2015. Diego descumpriu o artigo 89 Lei de Licitações (Lei Federal nº 8.666/93) e firmou, sem licitação, 12 contratos ilegais com atrações artísticas em nome da prefeitura de Ipojuca. O segundo é o tenente da Polícia Militar de Santa Catarina, Eduardo Neves. A identidade do oficial foi confirmada pela corporação na manhã desta terça-feira. O terceiro é o empresário Luciano Gil Mendes Coelho. O jornal piauiense O Dia revelou que ele já foi preso em uma operação da Polícia Federal que desarticulou esquema de desvio de dinheiro público. A fraude ocorreu em licitações da prefeitura de Araripina, em Pernambuco, no ano de 2015, quando Luciano ocupou cargo de inspetor do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Piauí (CREA-PI).

Em outra circunstância, o brasileiro Lucas Marcelo pediu para que duas crianças estrangeiras repetissem termos com conteúdos chulos e homofóbicos. Um dos garotos seguiu as orientações do rapaz, enquanto o outro permaneceu calado.



Já o supervisor de aeroportos Felipe Wilson, então funcionário da companhia aérea Latam, instigou três mulheres a repetirem a frase: “eu quero dar a b... para vocês”. Assim que tomou conhecimento da ocorrência, a Latam desligou Felipe do seu quadro de funcionários, alegando ‘respeito ao seu código de ética e conduta’.



Outro ofensor é mineiro e mora em Montes Claros. Leandro Dias pede para que uma mulher estrangeira trajada com uniforme de voluntários da Copa do Mundo pronuncie palavras de cunho sexual. “Você vai dar para todo mundo de Montes Claros”. A família de Leandro foi localizada, porém não quis se pronunciar sobre as imagens produzidas por ele na Rússia (com Luiz Ribeiro).



Na Rússia, brasileiros repudiam casos de assédio:







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