COPA DO MUNDO

A Copa da vergonha: Mineirão assiste ao pior trauma da história da Seleção Brasileira

Diante da Alemanha, Brasil sofre em casa o maior vexame em um século de história e prova que, sim, era possível amargar uma derrota pior que o Maracanazo de 1950

postado em 09/07/2014 07:24 / atualizado em 10/07/2014 22:33

Braitner Moreira - Enviado especial

REUTERS/Ueslei Marcelino

Belo Horizonte —
Houve um tempo no qual o brasileiro questionou se a Inglaterra seria mesmo a mãe do futebol. Do lado de cá do Atlântico, afinal, mudamos a relação entre a bola e os pés. Inventamos dribles, procriamos craques, fabricamos esquadrões. Conquistamos o mundo cinco vezes. Transformamos o esporte em mercadoria para exportação. Mas assim como impérios vêm e vão sem que os indícios da derrocada sejam bem interpretados, a Seleção Brasileira não percebeu que estava prestes a entregar o cetro. Despreparada, deixou-se abater no próprio terreiro, na noite de ontem, sem oferecer resistência a qualquer um dos chutes que fizeram a Alemanha derrotá-la por 7 x 1 na semifinal de uma Copa do Mundo disputada em casa.

Bastou meia hora para que o Mineirão sediasse a maior goleada sofrida pelo Brasil em um Mundial, bem além dos 3 x 0 para a França na decisão de 1998. Noventa e três minutos, então, foram suficientes para que a Seleção deixasse Belo Horizonte com a pior derrota em seus 100 anos de história. Diante do massacre, milhares de torcedores escolheram não esperar o ato final, deixando o estádio antes mesmo de o primeiro tempo acabar. Os que não desertaram transformaram o sofrimento em autoflagelação ao incentivar o adversário com aplausos e gritos de olé. Sim, um vexame maior do que o do Maracanazo foi possível.

Era um dia difícil para torcer. Quem gritou por “raça, raça, raça” aos 28 minutos do primeiro tempo, segundos antes de Khedira marcar o quinto gol alemão, só recorreu à primeira exigência que vinha à cabeça. No fundo, o torcedor sabia que as razões do colapso iam além da falta de motivação, ou mesmo do excesso dela. Ultrapassavam as ausências de Neymar, o maior craque da geração, e de Thiago Silva, o líder do grupo. Foi impossível, simplesmente, encarar a blitzkrieg alemã. Tanto que o Brasil levou 13 minutos para conseguir cometer a primeira falta, quando Marcelo puxou Müller — única alternativa para que o atacante não marcasse o segundo gol dele no jogo.

Enquanto a Alemanha trocava seus 483 passes no gramado do Mineirão, caíam por terra as preces de Felipão a Nossa Senhora do Caravaggio, a efetividade do sal grosso espalhado no gramado pelo preparador físico Paulo Paixão, a recém-surgida devoção ao rosário do goleiro reserva Victor. Nenhuma crença interrompia a incontestabilidade do adversário. Não bastassem dominar a Seleção Brasileira, os alemães ainda inverteram a rotação da Terra: chegaram a 223 gols marcados em Copas do Mundo, ultrapassando os 221 do time pentacampeão.

Reinvenção?

Houve um tempo no qual o brasileiro questionou os rumos de sua Seleção. Depois da eliminação em 2010, seria necessária uma reinvenção, uma volta às origens. Em novembro de 2012, porém, a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) decidiu que seria a hora de contar, mais uma vez, com os serviços ultrapassados de Luiz Felipe Scolari — soberbo ao traçar as ambições do time, arrogante ao dizer que não se arrepende das escolhas que fez. Sentado no banco de reservas, o técnico assistiu calado à pane dos comandados, sem nem ousar mudar a estratégia fracassada.

Pior do que a omissão, só mesmo o silêncio do presidente da CBF, José Maria Marin, que fugiu do contato com os jornalistas. O homem que optou pelo atraso deu o próprio nome à nova sede da confederação, fez a entidade faturar R$ 436,5 milhões no ano passado e ainda não colocou em prática nenhuma medida para que o futebol brasileiro avance. Todos os convocados da Alemanha, exceto Klose, passaram por algum dos 360 centros de formação construídos e mantidos pela federação. E essa é só a primeira medida que a ruína de ontem precisa deixar de ensinamento a uma Seleção que ignora as categorias de base.

Brasil
Julio Cesar; Maicon, David Luiz, Dante e Marcelo; Luiz Gustavo, Fernandinho (Paulinho) e Oscar; Bernard, Hulk (Ramires) e Fred (Willian)
Técnico: Luiz Felipe Scolari

Alemanha
Neuer; Lahm, Jérôme Boateng, Hummels (Mertesacker) e Höwedes; Toni Kroos, Schweinsteiger, Khedira (Draxler) e Özil; Thomas Müller e Klose (Schürrle)
Técnico: Joachim Löw

Gols: Müller, aos 10, Klose, aos 22, Toni Kroos, aos 24 e aos 25, e Khedira, aos 28 minutos do primeiro tempo; Schürrle, aos 23 e aos 33, e Oscar, aos 45 minutos do segundo tempo
Cartão amarelo: Dante
Público: 58.141 presentes
Árbitro: Marco Rodríguez (Fifa/México)