Futebol Internacional

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Aos 51 anos, atacante campeão brasileiro de 1987 pelo Sport ainda joga em Portugal

Pitico prepara a segunda aposentadoria para o fim da temporada

postado em 05/03/2015 09:15

Redação /Correio Braziliense

Ricardo Pereira/Divulgação

Manuel Inácio Silva Filho, o Pitico, precisou de três décadas e meia de carreira no futebol para, enfim, render-se à palavra aposentadoria. Ou “retirada”, como se diz em Portugal, onde vive o atacante brasileiro, campeão nacional pelo Sport em 1987. Aos 51 anos, o gaúcho de Caxias do Sul, jogador do Futebol Clube São Marcos, da quarta divisão lusitana, ostentará o rótulo de atleta mais velho do país pela última temporada: em maio, ele deixará a equipe para se dedicar somente à função de técnico do time B do Farense, clube do qual é ídolo.

“Vão surgindo lesões que eu não tinha quando era mais novo. Além disso, preciso passar mais tempo com minha família”, justifica Pitico em entrevista, por telefone, ao Correio. Ele se recupera de uma cirurgia no menisco do joelho direito e deve retornar aos campos em 20 dias. Contusões à parte, o atacante se vangloria da boa forma física ao longo de 35 anos no mundo da bola. Ele afirma ter apenas 3kg a mais do que no auge da carreira, duas décadas atrás. “As pessoas me perguntam como aguento e respondo que o segredo é evitar a noite.”

Arquivo/DP/D.A Press
O cuidado com o corpo, mais que a teimosia em seguir no esporte, permitiu a Pitico prolongar a carreira por 11 anos. Em 2004, logo depois de encerrar a carreira no Olhanense, clube da segunda divisão portuguesa, ele recebeu convite do presidente do São Marcos, Manuel Batista, para fazer um teste no time. Naquele ano, a proximidade do centroavante com o gramado se restringia ao recém-iniciado negócio no ramo de jardinagem.

Pitico não hesitou: aos 41 anos, cancelou a aposentadoria e, por diversão, como sustenta, retornou aos campos. “Falei para fazermos um teste. Ele veio e em um jogo deixou toda a gente de boca aberta”, relembra Batista, atual mandatário da equipe de São Marcos da Ataboeira.

No vilarejo de 255 habitantes, tornou-se ídolo. Ao fim de cada partida no Estádio João Celorico Drago, campo de terra batida com capacidade para 500 pessoas, ocorre uma festa de fãs e atletas, independentemente do resultado. “A relação com a torcida é a mais próxima possível. Imagine ser querido pelos torcedores e conhecer todos eles”, descreve o jogador, que concilia os duelos pela equipe da quarta divisão com a função de treinador do Farense B, da segunda divisão lusitana.

A 121km do povoado, em Faro, o brasileiro retribui a idolatria em outro clube, no qual viveu o auge na profissão. Ídolo do Farense, que defendeu de 1988 a 1994, Pitico não figura no hall de heróis da equipe pelas modestas marcas — balançou as redes 22 vezes em 161 jogos, média de 0,14 gol por jogo —, mas pelo vice-campeonato na Taça de Portugal na temporada 1989/1990. O clube acabou derrotado pelo Estrela da Amadora na decisão. “Foi o mais próximo que o time esteve de ganhar um torneio nacional. Até hoje, comemoram como se tivéssemos conquistado a taça.”

Impedido de sair

O status adquirido na equipe de Faro, inclusive, impediu que o atacante vestisse a camisa dos gigantes de Lisboa, Benfica e Sporting. “Com os salários oferecidos pelos clubes, eu poderia comprar metade da cidade”, brinca. “Não me estabeleci financeiramente como gostaria, mas não me arrependo, pois sou muito querido até hoje”, completa Pitico, que revela ter recebido proposta do Palmeiras em 1989, na primeira temporada em Portugal.

Ricardo Pereira/Divulgação
O interesse do alviverde naquele ano balançou Pitico. O jogador por pouco não retornou ao Brasil para continuar a escrever a curta história no futebol do país, interrompida em 1988, quando deixou o São José-SP. O gaúcho, no entanto, exalta as passagens pelos times brasileiros. E manda o recado: “O Sport é campeão brasileiro de 1987”.

O título nacional daquele ano ainda provoca briga no tapetão. O Flamengo trava uma disputa judicial para ser reconhecido como o campeão. No ano passado, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) se colocou a favor do clube pernambucano. O rubro-negro carioca, no entanto, não se deu por vencido. No mês passado, recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF) e aguarda uma solução.

“Nós comemoramos como se tivéssemos levantado a taça”, relembra Pitico. O Flamengo não quis nos enfrentar em uma final, mas acho que os dois clubes têm esse título”, diz ele, que ostenta no currículo, além do campeonato nacional, a Série B portuguesa pelo Farense em 1990. Em 1987, porém, o atacante, então com 24 anos, era reserva de Robertinho.

Saudade da terra

Os 27 anos de vivência em Portugal suprimiram o sotaque gaúcho de Pitico e acrescentaram expressões típicas da língua lusitana. Termos como “jovens” e “rapaz”, por exemplo, deram lugar a “miúdos” e “gajo”. As raízes brasileiras, no entanto, não desapareceram. Nem mesmo a vontade de regressar à terra natal para morar durante “algumas épocas”, nas palavras dele.

“Voltaria sob a única condição de fazer estágio com um grande treinador. Hoje, eu não tenho o mínimo conhecimento sobre o futebol do Brasil e tenho muita vontade de aprender”, conta o jogador-treinador, que não pisa em solo brasileiro desde 2010. Ele sonha com a chance de acompanhar os amigos Emerson Leão, atualmente sem clube, e Levir Culpi, técnico do Atlético-MG.