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CORRIDA DE RUA

Últimos brasileiros a ganharem a São Silvestre são de Brasília

Desde Marílson dos Santos, em 2010, e Lucélia Peres, em 2006, só africanos faturaram a prova mais tradicional do país

postado em 30/12/2017 13:11 / atualizado em 30/12/2017 13:19

AFP/Miguel SCHINCARIOL
Desde a última vez que um brasileiro foi campeão da Corrida Internacional de São Silvestre, duas Copas do Mundo de futebol se passaram e o Brasil se prepara para mais um Mundial. O jejum dura seis anos entre os homens e 10 entre as mulheres — a nova chance de encerrá-lo será amanhã, a partir das 8h20, com a 93ª edição da prova que percorre 15km no centro de São Paulo. Marílson Gomes dos Santos foi o último campeão, em 2010; e Lucélia Peres, a última brasileira, em 2006. Em comum, os dois têm a cidade onde deram as primeiras passadas: Brasília.

Marílson conheceu a corrida de rua no Centro Educacional 2 de Ceilândia Norte, aos 9 anos, quando se juntou ao irmão mais velho nos treinos de atletismo da escola, com o treinador Albenes Souza — até então, Marílson só queria saber de jogar futebol. O único brasileiro tricampeão da São Silvestre lamenta os conterrâneos não visarem mais a prova como antes. “Ter popularizado mais a corrida de rua é bom para a modalidade, mas o atleta que quer realmente ganhar precisa se propor a focar uma corrida específica”, aponta.

Mineira de Paracatu, Lucélia se considera mais brasiliense do que tudo, pois mudou-se para a capital federal aos 2 anos. Da cidade natal, ela guarda lembranças das férias em família. A campeã da São Silvestre de 2006 observa que a falta de incentivo e patrocínios no país motiva os corredores a competirem em um número excessivo de provas, sem conseguir focar em uma, pois vivem dos valores conquistados nas premiações. “Hoje, há mais dinheiro do que quando eu venci a São Silvestre, mas não chega ao fim da forma devida”, critica.

A pouca quantidade de clubes de alto rendimento fora do Sudeste brasileiro aumenta a extensão do problema. A questão logística fez Marílson sair de Brasília ainda aos 15 anos para integrar o Sesi de São Caetano do Sul, em São Paulo. “Eu deixei Brasília há 27 anos por não ter condição de treinamento e continuo vendo a mesma situação”, lamenta.

A capital é considerada um celeiro de atletas, por ter revelado outros fundistas, tais como Joaquim Cruz, Carmem de Oliveira e Valdenor Pereira dos Santos. “No DF, temos muito espaço para treinar, uma altitude considerável e climas adversos na época da seca, o que é favorável para desenvolver talentos. É uma pena que, quando despontaram, não estavam representando Brasília”, comenta Lucélia.

A competidora foi revelada por um projeto de atletismo no Paranoá e considera-se uma vitoriosa por nunca ter mudado de cidade. Com exceção a um parêntese de 2009 a 2010, quando representou o Pinheiros, em que ela seguiu treinando em Brasília. “Por causa de resultados, consegui patrocínios que me deram condição de me manter na cidade. E acredito que ficar da estrutura familiar me ajudou bastante”, comemora.

A corrida pela TV

Tanto Marílson quanto Lucélia não competem mais na São Silvestre. Marílson encerrou a carreira de atleta no ano passado, aos 39 anos, após disputar a maratona da Rio-2016.

Aos 36, Lucélia continua na ativa. Ela diminuiu as participações em provas de 10km e passou a encarar corridas mais longas. Completou a primeira maratona neste ano, em Buenos Aires, terminando na 11ª posição. Também disputa corridas de rua em Brasília, administra a própria assessoria esportiva para atletas amadores e curte o filho Arthur, de 3 anos. Ela se preparava para a São Silvestre de 2013 quando descobriu a gravidez. Não pôde competir naquela temporada e, desde então, partiu para uma nova tradição: acompanhar a corrida sempre pela TV de casa.

Para quebrar o domínio africano

O jejum brasileiro no topo do pódio da São Silvestre tem relação direta com a hegemonia dos africanos na prova. E, para Marílson Gomes dos Santos, a maioria dos países da América Latina e da Europa está sofrendo com a falta de renovação de atletas em provas de longas distâncias. Entre os países que entram nesta lista estão os africanos. E, segundo ele, principalmente por questão cultural.

“O atletismo é o esporte número 1 dos africanos. É como o futebol para os brasileiros”, acredita Marílson. Por revelar muitos talentos, os países africanos sempre contam com representantes fortes nas principais provas do mundo. Nesta São Silvestre não é diferente. Campeão da Maratona de Paris deste ano, o queniano Paul Lonyangata fará sua estreia na corrida, que também contará com o queniano Esther Kakuri, campeão da Meia Maratona Internacional do Rio de Janeiro na temporada e quinto colocado da São Silvestre em 2016.

Entre os favoritos na prova masculina, há ao menos mais cinco quenianos: Stanley Biwott, Philemon Cheboi, Edwing Rotich, Marwa Mkami e Paul Kipkemboi. Na prova feminina, as quenianas também se destacam. Flomena Daniel foi terceira colocada na Maratona de Paris deste ano; Leah Jerotich é a atual campeã da Volta da Pampulha e da Maratona de São Paulo; e há ainda Paskalia Chepkorir e Rosemary Monich.

Ao menos o Brasil contará com o retorno do campeão brasileiro da São Silvestre de 2006. Aos 34 anos, Franck Caldeira voltará a disputar a corrida de rua mais tradicional do calendário nacional após sete anos de ausência para focar a briga por uma vaga nas Olimpíadas de Tóquio-2020.

O brasileiro que chega como principal candidato a quebrar o jejum nacional, porém, é Giovani dos Santos, 36. O mineiro alcançou um lugar no pódio nas últimas seis edições — terminou em quarto lugar no ano passado — e foi heptacampeão na Volta da Pampulha, no início do mês. “Nós, que competimos aqui de janeiro a janeiro, ao fim do ano, estamos desgastados. Já os africanos chegam mais descansados”, avalia.

1Entre os nomes da elite nacional, há ainda Wellington Bezerra, Gilberto Lopes, Valério Fabiano e Éderson Pereira. Na prova feminina, a melhor brasileira na edição do ano passado foi a mineira Tatiele de Carvalho, com a sétima colocação. Ela promete competir em alto nível novamente neste ano. As outras brasileiras que chegam fortes são Joziane Cardoso dos Santos e Andréia Hessel.

O tamanho do jejum

Campeões desde o último brasileiro a ganhar a prova masculina
Ano          Atleta                               País
2010    Marílson dos Santos            Brasil
2011    Tariku Bekele                    Etiópia
2012    Edwin Kipsang                   Quênia
2013    Edwin Kipsang                   Quênia
2014    Dawit Admasu                   Etiópia
2015    Stanley Biwott                  Quênia
2016    Leul Aleme                       Etiópia

Campeãs desde a última brasileira a ganhar a prova feminina
Ano        Atleta                                    País
2006    Lucélia Peres                    Brasil
2007    Alice Timbilili                   Quênia
2008    Yimer Wude Ayalew           Etiópia
2009    Pasalia Chepkorir               Quênia
2010    Alice Timbilili                    Quênia
2011    Priscah Jeptoo                   Quênia
2012    Maurine Kipchumba             Quênia
2013    Nancy Kipron                     Quênia
2014    Yimer Wude Ayalew            Etiópia
2015    Yimer Wude Ayalew            Etiópia
2016    Jemima Sumgong               Quênia