
Com Arrais, o Distrito Federal agora chega ao terceiro mestre com o nono dan (espécie de pontuação para mostrar a habilidade e o conhecimento do judoca). Além dele, somente Takeshi Miura e Júlio Adnet chegaram a mais alta graduação da modalidade em Brasília. Um caminho de dores, choro, broncas, mas também de muita alegria e sentimento de dever cumprido, nas palavras do próprio Arrais. “É uma emoção muito grande ser reconhecido não só por Brasília, mas pela Confederação (Brasileira de Judô) e por todos dessa família do judô pelo trabalho de uma vida inteira. Não existe dinheiro no mundo que pague isso”, define o mestre.
Um trabalho que começou quando ele ainda era aluno, aos 12 anos, no Rio de Janeiro. O menino havia desembarcado na capital carioca anos antes, com a mãe, Eulina, e os irmãos, todos vindo de Fortaleza. Um ano depois, em 21 de abril de 1960, a família chegou para a inauguração do sonho chamado Brasília. E daqui, Arrais nunca mais saiu. “Já recebi muitos convites para deixar Brasília, mas preferi construir minha carreira aqui”, conta. Além da própria aposta na cidade, não queria deixar a família aqui, principalmente a mãe, que, até hoje, aos 93 anos, acompanha as peripécias do filho. “E muito lúcida, viu?”, lembra.
Na capital federal, chegou a trabalhar por seis anos como funcionário público, porém, deixou a carreira promissora de lado quando descobriu a paixão pelo judô. Começou a dar aulas com 17 anos. Aos 23, depois de passar pelas mãos de mestres do nível de Miura, Sérgio Baldino e Natanael Tolosa, entre outros, decidiu ensinar. E, desde então, sensei Arrais sabe do potencial que tem para criar campeões. Mas antes de construir alguém capaz de ganhar uma competição, o objetivo era usar o esporte como educação e formação. “Já tirei muita gente do caminho ruim. Fui até conversar com traficante para livrar alunos meus das drogas”, lembra. “Se uma pessoa não tiver disciplina, moral, ela nunca vai se destacar em nada na vida”, ensina.
Jigoro Kano
Esse enfoque, lembra Arrais, nasce com o próprio judô e os ensinamentos e as práticas do mestre Jigoro Kano, o criador da modalidade. Para ele, a teoria aplicada resulta em campeões. “A filosofia do judô faz com que a pessoa seja espartana, centrada. O talento, no judô, é só 5%. O resto é transpiração, esforço, trabalho, acordar cedo, deixar de ir a uma festa para se dedicar”, aponta. E diversos vencedores do tatame brasiliense passaram pelas mãos de Arrais, seja no início, seja durante a carreira. Como o bicampeão mundial de masters e mestre Edson Schultz; o mestre Luciano Gonçalves; os irmãos Diogo e André Maia, Carlos Eduardo e Leonardo Luz, e Shozo, Shiro e Caroline Yoshioka; Felipe Amaro Braga; a filha Adriana Braga; e a vice-campeã mundial Érika Miranda.
Érika, apesar de não ter começado a lutar com Arrais, aprendeu muito com o mestre e fez questão de entregar a faixa vermelha para o professor, no último dia 10. Para o cearense bravo — mas com o coração do tamanho do mundo, como os alunos fazem questão de destacar —, que adotou Brasília como lar, um verdadeiro prêmio para coroar toda a carreira. E mesmo em cima do palco, ele teve a certeza de que não estava deixando de ensinar. “Eu sei que essa graduação abre as portas para outros professores, que vão se esforçar para chegar ao mesmo lugar”, garante o sensei.