FORA DE ÓRBITA

Descolados da realidade: Arrogantes, Felipão e Parreira insistem que acertaram

Dupla insistiu no acerto do trabalho de preparação para o Mundial, desprezou contradições e demonstrou arrogância

postado em 10/07/2014 10:13 / atualizado em 10/07/2014 12:48

REUTERS/Marcelo Regua

Rio de Janeiro — Pior do que os 90 minutos da histórica derrota por 7 x 1 para a Alemanha na terça-feira, no Mineirão, foram os 52 minutos de entrevista coletiva não programada — palavras do diretor de Comunicação da CBF, Rodrigo Paiva — no dia seguinte à tragédia. Apelidados de “dream team” pela Fifa antes do início da Copa, Luiz Felipe Scolari e Carlos Alberto Parreira cumpriram a obrigação. Levaram a comissão técnica ao palco para uma lavação de roupa suja diante da imprensa. A estratégia deveria ter o desfecho do “day after” da Squadra Azzurra, após a eliminação precoce na fase de grupos. Mas faltou vergonha na cara. Tanto o técnico Cesare Prandelli quanto o presidente da Federação Italiana, Giancarlo Abete, pediram demissão no dia seguinte ao caos dos tetracampeões. Abandonado pelo mandatário da CBF, José Maria Marin — o mesmo que se sentou ao lado dele em 7 de maio, na última ceia, ou melhor, na convocação antes da Copa em uma badalada casa de show no Aterro do Flamengo —, Felipão contou apenas com o fiel escudeiro Parreira.

Enrolado com uma papelada esparramada sobre a mesa, Scolari olhava para baixo enquanto ouvia cada pergunta, à caça de números capazes de sustentar a insistente tese de que a Seleção teve apenas seis minutos de pane durante toda a Copa, no início do clássico contra a Alemanha. A prestação de contas da comissão técnica foi um festival de contradições.

Felipão começou a assinar o atestado de culpa ao reconhecer que faltaram medalhões na equivocada convocação. “Veja bem, estou dizendo que a Alemanha tem oito anos de preparação, nós temos um ano e meio. Experiência em determinados momentos é importante”, sustentou. Havia nomes rodados na praça, mas o treinador se agarrou ao elenco da Copa das Confederações e deu as costas a pelo menos quatro deles: Robinho, Kaká, Ronaldinho Gaúcho e Luis Fabiano. Em um erro de avaliação, apostou que os garotos segurariam a onda.

Acusado de comandar poucos treinos, Felipão exibiu um cronograma com o número de atividades realizadas na Copa das Confederações e no Mundial. “Se forem pesquisar e olhar os dados da Copa das Confederações, foram os mesmos, o mesmo número de treinos”, disse. A comissão técnica secou tanto os jogadores que poderiam chegar à final da Champions League que apenas Marcelo foi à final. Em vez de antecipar a apresentação, desperdiçou uma semana. Dono da casa, o Brasil foi um dos últimos a se apresentar para a pré-temporada.

Os números continuaram norteando a defesa de Felipão. “Depois da Copa das Confederações, tivemos uma derrota e nove vitórias.” Esqueceu-se de dizer quem foram os adversários. Nenhum de ponta antes do Mundial: Suíça, Austrália, Portugal, Coreia do Sul, Zâmbia, Honduras, Chile, África do Sul, Panamá e Sérvia. Duelos tão enganosos que fizeram o treinador acreditar ainda mais que estava tudo pronto. “Nós tínhamos uma equipe preparada, um sistema de jogo”, insistiu. Aqui, mais um problema. Realmente era apenas uma configuração tática, que jamais começou sem Neymar até a humilhação diante da Alemanha. Não havia sequer um plano B.

Ainda assim, Felipão se gaba. “É a primeira vez, desde 2002, que chegamos à semifinal. Foi uma derrota ruim, seis minutos de pane geral”, voltou a dizer. O Brasil voltou, sim, ao G-4, mas a campanha foi em casa. Independentemente do resultado contra a Holanda na decisão do terceiro lugar, a Seleção entrará para a história como o país sede que recebeu o torneio duas vezes e, em ambas, terminou atrás dos arquirrivais — Uruguai (1950) e Argentina (2014).

De saída

Felipão sabe que não é mais o técnico da Seleção. Deixará o cargo em Brasília, onde assumiu pela primeira vez o agasalho em uma casa da CBF no Lago Sul. Influente, o presidente da Federação Catarinense, Delfim de Pádua Peixoto, fez, então, a cabeça de José Maria Marin e Marco Polo Del Nero — respectivamente, o atual presidente da CBF e o sucessor eleito. Felipão acusou o golpe sem uma gota de humildade: “No único título que o futebol de Santa Catarina tem, eu era o técnico (Criciúma na Copa do Brasil de 1991). Então, o Delfim tem de me agradecer de joelhos. Nunca ganharam nada, e o que ganharam foi graças a mim”.

Nos bastidores, o favorito a assumir o cargo é Tite. Mas há quem diga que Vanderlei Luxemburgo, comandante da Seleção de 1998 a 2000, faz da amizade com José Maria Marin e Marco Polo Del Nero as chaves para a segunda chance.