OBSERVADORES

Disputa judicial impediu Felipão de contar com o espião da Seleção do tetra e do penta

Gallo e Roque Júnior só foram escolhidos pela comissão técnica para o cargo de observadores porque Jairo dos Santos não estava disponível

postado em 11/07/2014 08:39 / atualizado em 11/07/2014 10:12

Marcos Paulo Lima - Enviado especial /Correio Braziliense

Paulo Sérgio/Lancepress

Rio de Janeiro — A inexperiência de Alexandre Gallo e de Roque Júnior na função de observadores técnicos é uma das causas de o técnico Luiz Felipe Scolari ter ignorado o relatório da dupla de espiões sobre a Alemanha na véspera da pior derrota da história da Seleção em 100 anos de história.

Quando assumiram o cargo, Felipão e o coordenador Carlos Alberto Parreira queriam ao lado Jairo dos Santos, espião da Seleção em oito copas e campeão em duas — em 1994, como colaborador de Parreira na campanha do tetra; e em 2002, na função de parceiro do próprio Felipão.

O cooordenador fez o convite pessoalmente a Jairo, mas o diretor Jurídico da CBF, Carlos Eugênio Lopes, vetou a contratação porque o escolhido está em litígio com a entidade desde 2010, alegando falta de pagamento. A CBF perdeu a queda de braço em primeira instância, foi obrigada a pagar uma indenização de 30 anos de vínculo empregatício, mas recorreu da decisão.

Sem o profissional de confiança, a comissão técnica partiu para o improviso. Na Copa das Confederações, aproveitou o coordenador das Divisões de Base e técnico da Seleção Sub-20, Alexandre Gallo. Felipão e Parreira sabiam que a carga de trabalho seria dobrada na Copa do Mundo e acrescentaram o ex-zagueiro Roque Júnior, fechando o time de espiões.

Ambos assumiram a missão de abastecer a Seleção com informações do adversário e, aparentemente, estavam sobrecarregados. O Correio flagrou ao menos três vezes uma terceira pessoa, que pediu anonimato ao ser reconhecido, fotografando e anotando informações de todas as seleções que passaram pelo Maracanã — incluindo a alemã.

Pressão aumentou

Nos dias anteriores ao jogo contra os germânicos, a pressão sobre os espiões cresceu devido à necessidade de formar um time sem Neymar. O relatório de Gallo e Roque Júnior apresentava o lateral-esquerdo Höwedes como atalho para o sucesso diante da Alemanha, mas também mostrava a necessidade de reforçar o meio de campo. Uma das alternativas seria sacar Fred, isolar Hulk no ataque e tentar domar o toque de bola, a velocidade e intensidade da Alemanha.

Inseguro com as recomendações, Felipão escolheu explorar Höwedes com Bernard em vez de ter o quinteto Luiz Gustavo, Fernandinho, Paulinho, Oscar e Willian no meio. A reportagem tentou contato com Gallo, mas ele não retornou à mensagem deixada na caixa-postal.

Na véspera da partida, Luiz Felipe Scolari declarou fé no dossiê: “Tenho um grupo de trabalho espetacular. O Gallo e o Roque (Júnior) viram detalhes e nos deram confiança de que faremos o correto, nós confiamos. Pelas características, já está escolhido (o substituto de Neymar)”. Em entrevista à rádio Globo, uma aposta de Gallo não se confirmou. “Acho que ele (Joachim Löw) dever vir com Lahm de lateral e o Müller de centroavante, apostaria nesse time para enfrentar o Brasil”, arriscou o observador. Klose foi o centroavante.


Os conselhos de Alexandre Gallo na véspera de Brasil x Alemanha:

“Precisamos apresentar um jogo com velocidade, o Felipão está pensando nesse sentido e sabe o que fazer. A linha alta deles pode nos favorecer. O Neuer deu 28 passes, é um goleiro de linha, que joga fora da área. Quando o adversário tenta a bola longa, ele sai para dar o combate e afastar a bola. Temos que fazer os lançamentos, mas não forçar tanto e observar o posicionamento dele. Sempre achei que o sistema alemão seria muito duro para a gente. A transição entre defesa e ataque é muito rápida, e o Brasil tem dificuldade para parar isso. A equipe mais organizada taticamente e tecnicamente, sem dúvidas, é a Alemanha. É um time muito forte e com bons jogadores. Acho que ele (Joachim Löw) dever vir com Lahm de lateral e o Müller de centroavante, apostaria nesse time para enfrentar o Brasil.”

Informações para decidir

Se Gallo e Roque Júnior determinaram a Felipão o substituto de Neymar, erraram. É o que dizem dois ex-observadores da Seleção consultados pela reportagem. Ambos trabalharam em diferentes mundiais na função e deixam claro que, de acordo com a ética e a hierarquia da função, um espião jamais pode determinar ao treinador o que deve fazer.

“Na Copa do Mundo de 1998, na França, a minha função era ver os adversários, filmar, fotografar, produzir um relatório e entregar o dossiê ao Zagallo. Ele e o Zico (coordenador) analisavam tudo e tomavam as decisões”, disse o ex-goleiro Gilmar Rinaldi, um dos agentes secretos do Velho Lobo na campanha do vice-campeonato.

Leovegildo Júnior, hoje comentarista da tevê Globo, foi observador técnico de Parreira na Copa do Mundo de 1994, nos Estados Unidos, e de Zico na seleção do Japão, em 2006, na Alemanha. Ele também afirmou que jamais teve liberdade para determinar a escolha do treinador.

“Na campanha do tetra, a minha função era reunir o máximo de informações sobre os adversários. A escalação e a postura do time eram (decisões) tomadas pelo Parreira e o Zagallo, eu não apitava em nada. Lembro, por exemplo, que preparei o jogo de estreia (contra a Rússia) e entreguei o que tinha visto aos dois. E olha que eu sou muito amigo do Parreira, mas eu jamais disse, por exemplo, que A ou B tinha que ficar ou sair do time”, testemunha.